Discoteca Básica Gilberto Gil: quatro álbuns para mergulhar na pluralidade sonora do artista

26/06/2025

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Por: Lucas Vieira

Fotos: Divulgação/Rafa Rocha

26/06/2025

Gilberto Gil trouxe uma identidade única para o violão brasileiro, que vem sendo construída ao longo de seus mais de 50 anos de carreira. Com influências marcadas pela música nordestina, o samba, a bossa nova, o reggae, o rock e a música negra norte-americana, o cantor baiano tornou-se referência internacional no instrumento.

Suas características como violonista incluem montar acordes invertidos para poder tocar simultaneamente a harmonia e as notas do baixo, o uso de unhas postiças na mão direita, que servem como palhetas e adicionam caráter percussivo ao seu toque, e a mistura de harpejos com cordas soltas.

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Uma de suas técnicas mais cultuadas é a emulação do resfolego da sanfona no violão, ilustrada com excelência na canção “Expresso 2222”. Constantemente, o cantor experimenta novas sonoridades com seus instrumentos, usando ao longo da carreira violões de marcas como Di Giorgio, Tagima, Gibson, Ovation e Sadowsky. Separamos nesta Discoteca Básica alguns álbuns que ilustram a pluralidade musical do violão de Gilberto Gil, com foco em características que compõem sua forma de tocar. Confira:

Louvação (1967)

A pré-história de Gilberto Gil no mercado fonográfico começa em 1962 e segue até 1966, período em que lançou um compacto duplo e três de 78 rotações pela gravadora baiana JS discos, onde também gravou diversos singles, além de outro disquinho de duas faixas feito na RCA Victor.

Essas primeiras gravações fazem parte da coletânea O Retirante (2010), que também inclui uma fita demo do cantor de 1966. O primeiro LP veio em 1967, Louvação. Com canções em que os arranjos orquestrais se destacam e a estética sonora da bossa-nova predomina, a obra apresentou ao Brasil a versatilidade do violão de Gil em repertório que inclui música sertaneja, capoeira, samba e marcha.

É um disco de estreia que já mostrava, como dizia o texto de contracapa assinado por Torquato Neto: se tratando de maneiras de fazer música brasileira, Gilberto Gil prefere todas. O álbum inclui faixas indispensáveis do cantor, como “Viramundo”, “Procissão” e “Roda”.

Gil e Jorge (1975)

Foi por meio de uma jam session realizada na casa de André Midani, da qual também participaram Eric Clapton e Cat Stevens, que nasceu a ideia de um disco que reuniu a conexão ímpar da musicalidade de Gilberto Gil e Jorge Ben.

Percebendo a potência do encontro histórico daqueles dois artistas, o presidente da Phonogram convidou a dupla a transformar aquela sintonia em LP. Gil e Jorge (1975), também chamado de Ogum Xangô, é um disco marcado por temas de longa duração e muitos improvisos, em que a essência musical dos dois artistas se encontram e se extrapolam.

O ritmo preciso de Jorge se une às melodias livres de Gil, os violões revezam os espaços e se complementam. É um disco em que o cantor baiano mostra todo o seu virtuosismo, tanto técnico, no instrumento, quanto a compreensão de suas infinitas possibilidades musicais.

Em Concerto (1987)

O álbum ao vivo de 1987 traz a apresentação de Gilberto Gil no projeto Luz do Solo, que levou grandes nomes da MPB ao Copacabana Palace acompanhados de seus violões. No disco, Gil conversa com a plateia entre as músicas, contando histórias e explicando canções.

No lado A, o cantor traça uma cronologia do início da sua carreira até o seu exílio. No B, apresenta seus sucessos então recentes e Jorge Mautner, com quem fazia o show O Poeta e o Esfomeado, participa lendo trechos de Nietzsche.

Este é o principal registro do cantor com seu instrumento em evidência nos anos 1980, período em que seu trabalho é marcado pela sonoridade dos teclados e das baterias eletrônicas. Com efeitos de eco na voz e violão de timbre muito cristalino, o artista mostra que a essência de sua musicalidade se sobressai independente das tendências sonoras da década.

Gil Luminoso (1999)

Gil Luminoso (1999) foi lançado originalmente encartado no livro de mesmo nome de autoria de Bené Fonteles, em 1999. Registro da pura beleza da voz e do violão de Gilberto Gil, o álbum foi lançado formalmente no mercado em 2006. Desejo antigo do cantor, o disco trouxe repertório que visitou as então quase quatro décadas de carreira do artista.

É um álbum em que Gil despe suas canções. O caráter intimista da obra evidencia a beleza da voz de Gil, a poética de suas letras e a essência de suas composições, além de mostrar a habilidade do artista como arranjador, transpondo todos os detalhes harmônicos, melódicos e rítmicos das faixas para o seu violão. Assim, músicas que ficaram conhecidas pelo público com arranjos fartos de instrumentos e detalhes, como “Tempo Rei”, ganharam nova identidade, com sua essência mantida.

Gilbertos Samba (2014)

Como em sua homenagem a Bob Marley, Kaya N’Gan Daya (2002), ou no disco que celebra o Rei do Baião, Canta Luiz Gonzaga (2012), Gil fez este disco em tributo a João Gilberto não apenas relendo seu repertório de forma reverencial.

O cantor aborda em Gilbertos Samba (2024) um olhar particular para a obra do “bruxo de Juazeiro”, mostrando como aquela voz doce e sussurrada e o jeito único de tocar violão ajudaram a moldar o artista que é Gilberto Gil. É um disco de mestre para mestre.

Gilbertos Samba (2024) recebeu vários adornos interessantes nos arranjos, como as percussões eletrônicas de Domenico Lancellotti e a guitarra de Pedro Sá. Contudo, o que está no plano de frente são o violão e a voz de Gilberto Gil.

Com arranjos econômicos, o cantor relê a obra de João com muita personalidade, mostrando o lado bossa-novista de seu violão em um disco que tem o frescor da sonoridade moderna dos músicos que o acompanham, destacadas nas faixas “Desafinado”, “Desde Que o Samba É Samba” e “Eu Vim da Bahia”. O álbum ainda conta com uma faixa autoral inédita, “Gilbertos”, que resume a importância de João Gilberto para Gil, sua geração, e toda a música brasileira.

*Esta matéria foi publicada originalmente na revista Noize 84 que acompanha o disco Gilberto Sambas, de Gilberto Gil, lançado pelo Noize Record Club.

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26/06/2025

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Lucas Vieira