Produzido pelo tecladista do Prince, estreia de Ina Magdala tematiza liberdade

22/09/2025

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Por: Vitória Prates

Fotos: Divulgação/Isadora Arruda e Rachel Pontes

22/09/2025

Em uma estreia apaixonante, Ina Magdala é uma promessa na nova MPB. O álbum Cabe Quem Quiser (2025), que chegou às plataformas na última sexta-feira (18/9), une sonoridade solar, narrativa sobre busca pela liberdade e inspiração em grandes cantoras. 

Nascida em Belo Horizonte, Ina começou a tocar piano na infância, mas foi em Nova York, quando se mudou para estudar Economia na NYU, que aprendeu a cantar e também passou a compor suas próprias músicas. De volta ao Brasil, conheceu Renato Neto — ninguém menos que o tecladista do Prince — que logo se tornou seu mentor.

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Cabe Quem Quiser (2025) é um álbum sem feats, mas com muita história. Em 10 faixas, Ina monta uma narrativa variada sobre se apaixonar — e perder esse encanto —, se encontrar e não deixar a ansiedade paralisar. Em uma das canções, canta até sobre uma aranha caranguejeira. 

É difícil definir a sonoridade — e Ina quer fugir desses rótulos. Pode ser indie pop, mas tem toques de eletrônico, funk americano e muito mais. Para dar vida ao projeto, a artista contou com apoio da Lei de Incentivo à Cultura e patrocínio da Desenvolve SP. 

Com o repertório, Ina já tem uma agenda de shows movimentada: em São Paulo, faz uma participação no show de Arrigo Barnabé, na Casa de Francisca, neste fim de semana (26/9 e 27/9), depois, toca em casa, Belo Horizonte (3/10), no Palácio das Artes. 

Retornando a São Paulo, Ina se apresenta, solo, no Teatro Estadual das Araras, no dia 16/10, e no Teatro Sérgio Cardoso, em 21/10. A Noize conversou com a artista sobre o trabalho e ainda montamos um faixa a faixa exclusivo. Confira o papo na íntegra abaixo: 

Ina, esse é seu primeiro álbum! Me conta, como estão as expectativas para esta estreia?

Quando a gente vai colocar um trabalho autoral no mundo, a expectativa é muito forte. Óbvio que a gente espera que as pessoas gostem, se conectem, conversem com elas e que tragam mensagens e construam pontes. Essa é a maior expectativa. 

Mas a arte é muito subjetiva, depende de cada um. O que eu espero trazer com o álbum são mensagens que possam confortar pessoas e mostram que estamos juntos. A música, para a humanidade, ocupa muito esse espaço de conexão.

Você nasceu em Belo Horizonte, mas foi em Nova York, quando se mudou para fazer faculdade, que você teve seu “despertar artístico”. Como essas duas cidades te inspiram?

Comecei a me apaixonar pela música em Belo Horizonte, escutando os mineiros e foi onde aprendi a tocar piano também, a música sempre fez parte da minha trajetória. Mas em Nova York comecei a frequentar os bares de jazz e fazer aulas de canto com Beverly Crosby que me acolheu. Ela cantava em vários bares por lá. 

Nós nos conhecemos quando algumas primas minhas foram me visitar em Nova York. E eu agendei um tour pelos lugares de jazz na cidade com um guia local. A Beverly fazia jazz sessions na casa dela e fomos escutar. 

Eu sou cara de pau [risos], já fui dizendo que queria cantar também, mas não sabia cantar afinado. Sempre achei cantar a coisa mais linda do mundo e queria fazer igual, o desconhecido tem seu brilho. Disse isso para a Beverly e ela respondeu: “Olha, geralmente não dou aula de canto, mas eu gostei de você, então vamos lá” [risos]. 

Em Nova York, toda semana eu ia para o Harlem e a Beverly meio que me adotou. Ela me ensinou a respirar corretamente e a interpretar as músicas, dizia: “Enquanto você não chorar com a letra não está fazendo direito” [risos]. 

Infelizmente, quando bateu a pandemia, eu estava em Portugal e mandei uns e-mails para a Beverly para saber se ela estava bem. Em um ponto não tive mais resposta e não consegui mais me comunicar com ela, o que foi muito triste para mim. 

Belo Horizonte é um lugar afetivo e Nova York é porrada, um soco no estômago — juntando os dois, dá para entender um pouco quem eu sou. Porque eu gosto do meu pão de queijo, mas também gosto do caos. Vou entre o conforto do afeto à beleza do caos.

O álbum foi produzido por Renato Neto, diretor musical e tecladista de Prince. Como foi trabalhar ao lado dele? 

Foi muito bom! Quando começou a produção, já éramos bem amigos. Assim que eu cheguei em São Paulo, ele se tornou meu mentor. Na cara de pau, pedi para ele me mentorar [risos].  Trabalhamos em um projeto juntos e eu falei: “Renato, por favor, quero muito que você seja meu mentor”. Com isso, começamos a experimentar diferentes sons no estúdio, compor juntos e nos tornamos muito amigos. Com o tempo, veio a ideia de compilar tudo isso e fazer um álbum.

Como você e o Renato se conectaram e como você se inspira no trabalho dele?

Tudo começou quando eu cheguei em São Paulo, no pós-pandemia. Dei uma palinha no Cura, projeto cultural que tem na cidade, e o baterista Marco da Costa me ligou no dia seguinte, dizendo: “Gostei muito do seu jeito de cantar. Você não quer trabalhar com um amigo meu que está fazendo uma biblioteca musical?”. E eu respondi: “Óbvio!”. 

No dia seguinte, fui para o estúdio e encontrei o Renato. Ele estava com várias composições que precisavam de letra. Coloquei letra em três e cantei outras duas e começamos a nos conectar dessa maneira. Foi uma sinergia muito boa, de muito respeito e admiração mútua, sabe?

Ainda nas parcerias, o álbum traz Paulo Lepetit, nas faixas “Tudo Meio Pouco” e “Apesar Do Que Fere”. Como foi a troca com ele nos bastidores?

Quem me apresentou o Paulinho foi o Marco da Costa, baterista super amigo, que, inclusive, toca bateria em várias faixas do álbum. A nossa sinergia foi imediata, enviei várias letras de músicas e ele me apresentou melodias para elas, que amei de primeira.

Foi maravilhoso trabalhar com o Paulinho, porque, além da melodia, ele trabalhou na produção dessas músicas. São ideias maravilhosas, brilhantes e fora da casinha [risos] Também uma linha de baixo inconfundível — ele tocou muito tempo com o Itamar Assumpção.

É denso, com profundidade e autêntico, me identifiquei com ele desde o início. Ele me contou que estava um pouco cansado do mundo da música, mas nosso encontro reviveu isso. Fico honrada. 

O artista precisa se despreocupar mais. O Paulinho falava que o Itamar [Assumpção] não estava nem aí [risos]. Somos menos loucos do que poderíamos por causa do mercado. Se você faz algo muito experimental, não vai vender, é um investimento que não tem retorno. E aí, como você vai comprar seu pão? 

Os dois estavam ensaiando, ligavam pedindo show e o Itamar falava: “Não dá, a gente está muito ocupado”, depois dizia que esse tipo de show não valia a pena [risos]. É algo de louco, mas faz sentido, porque, talvez, nesse show não quisessem o Itamar artista, mas sim uma performance enquadrada que, muitas vezes, precisamos fazer. 

“Cabe Quem Quiser” é a faixa de abertura e também nomeia o álbum. Como essa música define o projeto?

“Cabe Quem Quiser” traz a mensagem principal do projeto, musical e liricamente, que é uma busca pela liberdade. Liberdade de expressão, de fazer o que a gente gosta, por isso que ela foi escolhida. Musicalmente, ela mistura muitos estilos, fomos passeando. Tem uma pegada meio eletrônica, tem brasilidade, funk americano, que traz muitas das referências do Renato, traz uma mistura boa, um gostinho de tudo que tem no álbum. 

Quais foram as suas principais referências para o álbum?

Experimentamos bastante. As maiores referências para este álbum são cantoras brasileiras que não se encaixam em um gênero só. Por exemplo, a Rita Lee, ela não é rock e nem bossa nova. Ela é a Rita Lee, tem seu gênero musical próprio, faz muita coisa.

Marina Lima tem sua própria vibe também. Claro, tem elementos que trouxemos que conversam com esses lugares diversos, tem rock, brasilidade, um pouco de groove, mas que são temperos para as músicas. Rita e Marina foram grandes referências para o álbum. Também gosto muito de Letrux e de Elizeth Cardoso.

Entendo que a definição nasceu por causa da indústria da música, é pelo mercado que se define, porque o coração não define, a gente escuta, a gente ama ou odeia, mas e daí? Para vender, a indústria começou a rotular: é um indie pop.

Não é isso, mas tudo bem [risos]. Coloca aí qualquer rótulo e continuamos fazendo o que a gente gosta. Cabe Quem Quiser (2025) nasceu assim, escutando várias coisas e entendendo como que a Ina podia ser uma liga entre elas. É um álbum muito existencialista, a minha obra é assim. 

Falo muito de amor, porque o amor é tudo. É o amor pela vida, por nós mesmos e o amor romântico é uma parte disso, sempre vai ter ele, mas nunca vai ser só sobre ele. A não ser que um dia eu esteja muito na fossa e faça muita música sobre isso [risos]. 

O álbum conta várias histórias. Enquanto você compõe, traz um eu lírico diferente ou estamos falando sempre de você?

Às vezes sou eu, como em “Cabe Quem Quiser” e “Apesar do Que Fere”, mas nem sempre. “Erro Milenar”, por exemplo, eu não estou vivendo o que estou contando ali. Mas a gente — a gente é ótimo, né? Eu e todas as Ina’s da minha cabeça [risos] — escolhe um sentimento e tenta entrar dentro dele com todas as suas garras, capturando o que ele pode trazer. O sentimento é universal, cada um tem sua própria experiência, mas amor, dor, esperança, desilusão e liberdade são universais. 

Sinto que o álbum começa com uma narrativa mais existencialista e termina em uma festa. Como você organizou a ordem das faixas para que essa narrativa tivesse sentido?

A primeira — “Cabe Quem Quiser” — e a última música — “Pra Ter o Céu” —, eu sempre soube que estariam nessa ordem, mas as do meio nasceram dos ensaios. Começamos a ensaiar para gravar o álbum ao vivo e aí eu fui entendendo a ordem que eu gostava delas. Tem a parte lírica, mas a parte musical também dita muito, são as ondas de emoção.

Com o álbum no mundo, quais são seus próximos passos?

Os próximos passos são os shows. Estou muito animada para colocar o álbum no mundo ao vivo. Eu amo o estúdio, mas a melhor parte é sempre os shows. No estúdio, você grava, as pessoas vão escutar e se conectar, mas em casa, então a gente só imagina. Em show não, você olha para as pessoas, é a coisa mais linda!

Para os shows, o público pode esperar diversão e introspecção [risos]. É difícil pensar nos dois juntos, mas Cabe Quem Quiser (2025) tem umas letras densas e outras descontraídas. Buscamos trazer uma montanha russa de emoções, assim como é a própria vida. 

Confira Cabe Quem Quiser faixa a faixa

Quando montamos o faixa a faixa do álbum, Ina disse: “É difícil escolher só uma coisa, tem tanto por trás. Posso falar várias e depois você escolhe? [risos]”. Com leves edições, tentamos trazer tudo que ela abriu sobre Cabe Quem Quiser (2025). Leia (e ouça) abaixo. 

“Cabe Quem Quiser”: foi a primeira faixa que compusemos. Ela nasceu em um quarto de hotel, me veio a ideia do “Ah” que aparece no fundo. Nasceu de algo tão simples e foi se tornando tão complexa que virou a faixa principal do álbum. 

É a letra mais representativa dessa busca pela liberdade como escolha consciente. É uma luta diária estabelecer os nossos limites e definir o que importa; essa é a nossa liberdade. Cada pessoa vai definir de um jeito, mas é importante que cada pessoa possa definir por si, sem pitaco alheio [risos].

“Flerte Lunar”: tem três faixas no álbum que falam sobre o ciclo do afeto, e “Flerte Lunar” é a primeira delas. É sobre quando você se encanta pela pessoa e fica com borboletas na barriga de quando você conhece alguém e fica perdido no flerte lunar. É o início de um relacionamento, cair no universo de outra pessoa. 

“Uma Parte de Mim”: nasceu enquanto eu observava os pássaros. Cada um voava de um jeito diferente e comecei a viajar nessa ideia. Tudo que a gente vive, sente e faz se torna uma parte da gente. Os nossos medos, sonhos e desejos, o importante é estar aberto e preparado para o que vem, porque é sempre um mistério. A música nasceu dessa reflexão.

“Apesar do Que Fere”: foi a primeira música com o Paulo Lepetit. Mandei várias letras para ele e fomos juntando partes delas, assim nasceu “Apesar do que fere”. A mensagem principal da música é mostrar que estar presente é o principal. Ser como “teia de aranha em movimento” é construir a vida enquanto estamos vivendo. 

A tensão e a ansiedade nos paralisa, impede que construamos a teia. Vivemos em um mundo ansioso, quantas vezes a ansiedade não toma conta da gente? Então, a música fala sobre a ansiedade que paralisa a gente. 

“Vive de Aluguel”: é uma reflexão sobre a dor que vive de aluguel dentro da gente. Você quer que ela saia, mas a dor continua desfilando dentro de você. Nasceu de imaginar a dor como uma musa que está dentro de todos nós. A dor existe, precisamos reconhecer que ela está ali para podermos superar. 

“Tudo Meio Pouco”: segunda música que fiz com o Paulinho. No dia que terminamos “Apesar Do Que Fere” essa letra me veio de imediato. Nasceu das nossas conversas, das histórias dele com o Itamar [Assumpção]. Pensei: tem muito pouco louco hoje em dia. 

É louco de um jeito bom, de não ter medo de se expressar. Hoje, a gente é muito condicionado, nossos olhos são condicionados a telas, nossa atenção a minutos e não horas e eu super me incluo nesse rebanho ansioso. 

A gente precisa ver que isso existe e mudar. O tempo não é líquido, mas gasoso, você nem absorve o que acontece. A música é um grito, nasce dessa reflexão, como canto no trecho: “É urgente juntar o batalhão que demonstre o que sente”. 

“Caranguejeira”: é uma história real! Entrou uma aranha caranguejeira gigante no nosso estúdio no sítio que eu e Renato estávamos compondo. Tiramos ela, passa um tempo, ela aparece de novo. Começamos a brincar: “Ela está querendo uma música” e foi o que fizemos. É a música mais descontraída do álbum, nasceu de uma brincadeira. Faz parte dessa temática de liberdade poder fazer uma música sobre uma caranguejeira. Eu adoro ela. 

“Vai Entender”: é a segunda parte do ciclo de afetos. É o momento em que você está amando a pessoa de verdade. “A barragem foi por água abaixo”, eu estava pensando em uma barragem de verdade. Quando estamos nos apaixonando, colocamos barreiras, com medo de se entregar. A gente pensa: “será que abaixo a guarda ou não?” Tem pessoas que chegam já chutando a barragem e não tem como evitar. A música é desse lugar apaixonado. 

“Erro Milenar”: completa essa trilogia. Você faz tudo pela pessoa e vê que foi um erro que tem sido repetido há séculos porque todo mundo se decepciona ao deixar alguém ocupar um trono que não deveria. 

Ainda sim, o eu lírico não está tão sofrido, ela só está reconhecendo o erro. Quando a gente está na fossa, é bom escutar música de fossa. Mas, depois, vem a hora da transição, e “Erro Milenar” ocupa esse lugar de: chega de chorar! 

“Pra Ter o Céu”: é a mais dançante e feliz do álbum. Estou buscando a minha liberdade, tentando me encontrar e entender quem eu sou, assim faço minha própria festa e que cada um faça a sua própria festa. Mas, mesmo assim, você vai me ler como você quiser. 

Não julgue alguém. Quando você quer ler algo, você presta atenção, pode até não concordar, mas aceita, foca na sua própria festa porque cada um precisa fazer o que quiser. Viva sua vida, faça sua festa interior e se preocupe em ser feliz e se melhorar como ser humano. A gente nasce com tantos defeitos, ganha muitos outros e precisa ir melhorando. Acredito que estou aqui para me elevar espiritualmente. Essa música é a cereja do álbum.

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22/09/2025

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