O sonho de ter uma banda, muitas vezes, começa na adolescência, com violão desafinado no quarto, batucada na mesa e versos no caderno de matemática. Quando se junta um grupo, é mais do que sobre fazer música: é se expressar e encontrar pertencimento.
É o espírito colaborativo, seja com o microfone velho ou com turnê esgotada na Europa, que fez Bernardo Pasquali, Gustavo Karam, Bernardo Hey e Rafael e Gabriel Dunajski realizarem o sonho adolescente com o Jovem Dionísio.
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A banda, que antes fazia covers, chegou fazendo barulho em 2022, com o álbum de inéditas Acorda, Pedrinho (2022), lançado de forma independente. O sucesso foi puxado pela faixa homônima, que acumula 117 milhões de plays no Spotify.
Depois, reforçando o espaço recém-conquistado no indie pop, lançaram Ontem Eu Tinha Certeza (Hoje Eu Tenho Mais) (2024), com indicação ao Grammy Latino e feats plurais, que vão de Arnaldo Antunes ao Grupo Menos É Mais. Os meninos não querem se limitar e partem para uma nova aventura.
Com o encerramento de uma longa tour, eles prometem, agora, se concentrar no terceiro álbum. Neste ano, já lançaram “Bike”, em parceria com a Bolovo, e o clipe “Não Pense”. Em entrevista à Noize, Bernardo e Rafael (Fufa) falam sobre como é viver com o pé na estrada, próximos passos da banda e músicas que deixam no repeat.
Neste ano, vocês lançaram duas canções, “Bike” e “Não Pense” Com essas produções, sinto que estamos caminhando para um indie pop mais melódico. Elas vão integrar o repertório do novo álbum? Como será o som dessa nova produção?
BERNARDO: Não. “Bike” foi da parceria com a Bolovo e, para além de ser só uma música, integra um projetão com a marca, são três vídeos, no total. Já “Não Pense” marca um retorno nosso com o [Gustavo] Schirmer, produtor que a gente não colaborava há três anos. Estamos em um momento de feitura do nosso disco, mas essas músicas não vão fazer parte.
FUFA: É díficil falar como vai ser o novo disco. Estamos em flerte: são muitas coisas na cabeça refletindo, mas ainda é pouca coisa para poder divulgar. Vários pensamentos na cabeça e muito trabalho. O foco agora é trabalhar muito, desligar a chave de shows e ligar a chave de produção.
É muito sobre trocar, como somos uma banda, cada um tem suas referências e seus gostos, então estamos nessa fase de trocar indicações e pensando nos objetivos, para sacar as ideias e, só aí, começar a feitura do álbum. A vontade é lançar mais 25 discos, mas por enquanto estamos só nas ideias. [risos].
E quais indicações estão sendo compartilhadas nessas conversas?
FUFA: Difícil falar por todos, mas tenho escutado muita coisa, tem saído muito disco agora, o que é muito daora, dos artistas de fora aos daqui.
BERNARDO: Tenho ouvido muito Elliott Smith, Natalia Lafourcade, que, recentemente, lançou Cancionera (2025), bom demais! Mandamos vários discos novos um para o outro, Blood Orange também está para lançar disco, já soltou alguns singles. Também Daniel Caesar, Tame Impala e o Tyler The Creator que acabou de lançar Don’t Tap The Glass (2025). Hoje mesmo mandei para galera um EP da Dead Butterflies. Estamos ouvindo muita coisa, e todo dia aparece uma parada nova.
Como todo esse conteúdo em mente, o que o público pode esperar do novo álbum?
BERNARDO: Mais profundidade. Estamos indo muito mais a fundo no som e no que estamos falando. Aconteceram muitas coisas com cada um nos últimos anos, tanto musical quanto pessoalmente.
Voltando aos lançamentos deste ano, como foi o processo criativo dessas canções?

FUFA: Foram bem daora, elas carregam um pouco do que estamos pensando agora em produção. No começo [da carreira], você não tem tantas ferramentas, tem um limite de conhecimento musical e técnico. Agora, todo mundo sabe mais. Também estamos explorando coisas novas.
Por exemplo, toco guitarra, mas, recentemente, comprei um sintetizador. Agora temos um arsenal maior de som e queremos aprofundar e canalizar as coisas que gostamos, ser mais assertivo, também estamos mais criteriosos do que gostamos, os dois lançamentos trazem um pouco disso. Principalmente “Não Pense”, que é um som super minimalista, pouca coisa de eletrônica e samples, estamos nos aprofundando nisso e também voltando a origem de banda, com a experiência de troca.
Ambos também trazem clipes em película. De onde surgiu essa ideia?
BERNARDO: Antes do clipe de “Não Pense”, surgiu a gravação. Quando fomos indicados ao Grammy, descobrimos que iríamos viajar juntos para Miami, nos empolgamos com a ideia, nosso objetivo sempre foi ser indicado e poder viver uma viagem dessas juntos, ir para outro país por causa de um disco nosso em uma premiação. E, para comemorar a indicação, decidimos fazer uma viagem para Nova York.
A gente vive viajando, mas tem hora contada, de chegar e sair do hotel, então, tem vezes que conseguimos aproveitar um pouco e tem vez que não conseguimos aproveitar nada. Saímos [em Nova York] com o plano de gravar, mas sem saber se seria para uma música.
Existia um começo de “Não Pense”, mas, quando trouxemos a gravação para o Brasil tentamos em cima até de “Crochê”, que foi uma música lançada ano passado. Quando testamos em “Não Pense”, fez todo sentido: música e o clipe andam de mãos dadas. Esse clipe só aconteceu porque tem um anjo nas nossas vidas, o Felipe Fonseca, que gravou e editou o material, e conseguiu trazer, para essa viagem, um olhar tão sensível que, se dependesse do resto, ali não teria existido esse clipe. [risos].
“Não Pense” também é o reencontro da banda com Gustavo Schirmer, produtor de seu disco de estreia. Como foi retomar essa parceria?
BERNARDO: Foi massa. Passou um tempo desde a nossa vez em estúdio juntos, e, nesses três anos, muita coisa mudou na Jovem Dionísio, coisas que gostávamos, deixamos de gostar e passamos a nos importar com outras. O mesmo rolou com o Schirmer Vem a conjunção desse tempo longe. Em “Não Pense” é uma das coisas mais legais da música, é ver como voltamos a colaborar juntos, depois desse tempo todo.
FUFA: Também teve um processo de adaptação. A gente tinha uma imagem do som na cabeça do Schimer da época e ele tinha uma imagem nossa, do que a gente gostava na época. Foi um trabalho de introdução, tipo: “Ah, pera aí, sim, a gente era isso, mas agora estamos caminhando mais para esse lado”. Foi um processo legal de reconexão, ele mostrou as coisas novas que ele está gostando e a gente também, fomos nos entendendo. Foi bom para a gente, como banda, mostrar exatamente como queremos soar.
E qual é esse novo caminho que vocês querem chegar? O que mudou nesses anos?
BERNARDO: O processo de construir uma música enquanto a gente está tocando é um tipo de processo que a gente fez na construção dos shows. A gente sentava junto e ia tocando e testando juntos as ideias enquanto construía o som.
Nos últimos dois discos, desapegamos de construir dessa maneira, de trazer uma canção, tocar entre nós e descobrir, juntos, o que ela pode virar. Estávamos mais focados em testar ideias separados e ir adicionando nesse caldo, ao invés de juntar tudo e fazer tudo orquestrar em prol de um lugar que estamos enxergando. Isso aconteceu também porque aproximamos nossa conversa, passamos a falar abertamente do que a gente gosta, do que não gosta e do que anseia, esse processo, em si, já faz o som vir de uma forma completamente diferente.
Hoje, quando temos uma ideia, só tocando junto a gente termina. Não precisamos mais desmembrar a ideia, porque pra gente o melhor é o lugar que tem mais intenção e que conecta mais. Isso não é, necessariamente, conectado com a qualidade da gravação, se foi gravado com um microfone melhor ou pior. Mas é algo que a gente ouve e bate mais.
FUFA: Isso vale tanto para a parada musical quanto para as outras áreas, como visual e planos de banda. Nesses papos, a gente vai se entendendo e cada vez mais conseguimos expressar o que a gente quer. Estamos conversando muito sobre estar juntos e trocando ideias, estamos menos relaxados do que nunca, é mais provocativo um com o outro, e é o que queremos transmitir, essa vontade de estar inquieto.
Vocês estão finalizando uma intensa agenda de shows na Europa e no Brasil agora, em que momento o grupo está? O foco está em novas composições, tocar a produção do álbum ou já estão pensando em novas apresentações?
BERNARDO: Feitura de música. Só estúdio, estudo e gravação, é o foco agora.
Vocês se conhecem há muito tempo. Como é a convivência entre vocês na estrada? Essa turnê rendeu alguma história engraçada/curiosa/inusitada?
FUFA: Muita coisa [risos]. Temos que filtrar. Passamos muito tempo juntos e muito tempo na estrada, é uma família mesmo, então a gente já saca o que o outro gosta e o que incomoda. Sempre rende muitas histórias, principalmente agora na Europa, que é um lugar que você não vai sempre, então rola esse êxtase. O Meta, por exemplo, nosso produtor que está sempre com a gente, era a primeira vez dele na Europa e fizemos questão de acordar cedo e conhecer todos os pontos turísticos. Foi bem especial por ser a primeira vez dele em terras europeias, queríamos apresentar o melhor.
BERNARDO: O Meta também tocou em todos os shows. Ele tinha tocado com a banda poucas vezes antes, mas, nessa turnê, fizemos esse convite e mudamos os arranjos de algumas músicas para isso. Ele entrou como um power ranger branco e foi incrível. Todas as músicas que a gente toca no show, ele tinha feito com a gente, mesmo tendo subido no palco poucas vezes.
Estar no palco e olhar pra ele, fazendo seis shows na Europa, foi massa. Ele estava feliz da vida, tentando digerir o momento. Só isso já foi uma experiência absurda, mas tem várias histórias. Em Portugal, último show da turnê em Viseu, que é uma cidade que fica bem na fronteira e tem uma muralha em volta, o palco que a gente tocou era bem do lado de fora da muralha. Percebemos que estávamos em Portugal, do lado esquerdo, e do lado direito, que tinha um rio, já era Espanha. Foi muito louco. [risos].

O quanto o Jovem Dionísio cresceu e evoluiu de Acorda Pedrinho (2022) para Ontem Eu Tinha Certeza (Hoje Eu Tenho Mais) (2024)?
BERNARDO: Bastante, mas menos do que será do segundo para o terceiro. [risos]. Aconteceu muita coisa entre o primeiro e o segundo disco nas nossas vidas, foi a primeira vez de muita coisa. Conhecemos muita gente e nos percebemos em um lugar que não participavamos antes. Essas vivências foram sendo depositadas em nós. Principalmente, fazer show e viver na estrada, né? Sua relação com sua casa muda e a perspectiva de várias coisas também.
FUFA: Do primeiro para o segundo disco não que a gente aprendeu muita coisa, mas a gente conheceu, na verdade. Primeiro você conhece e depois que você vai estudar sobre aquilo, agora já deu tempo de maturar e entender o que a gente realmente gosta.
Ontem Eu Tinha Certeza (Hoje Eu Tenho Mais) (2024) conta com alguns feats, vocês tem alguma colaboração dos sonhos, podemos esperar alguma no nosso álbum?
BERNARDO: Tem vários sonhos, a gente está sempre adicionando nomes nessa caixinha de colaborações. Tem desde os heróis e heroínas máximas do Brasil, como Djavan, Jorge Ben Jor e Alcione. Também tem muita banda nova surgindo, que está no mesmo ambiente que a gente, adoramos colaborar com qualquer pessoa.
Estamos sempre dispostos a isso, vamos tocar e ver o que sai. A gente pode não achar alguma música, mas trocamos com muita gente para possíveis colaborações. Adoraria um dia fazer música com o Bruno Berle, mas ainda não achamos a música certa.
Ficamos sempre mandando música um para o outro, mas ainda não encontramos a certa. Descobri faz pouco tempo também a Mundo Vídeo, troquei uma ideia com o Gael [Sonkin] e adoraria fazer alguma coisa com eles, se formos para São Paulo ou se eles vierem para Curitiba. E você, Fufa?
FUFA: Estamos abertos, gostamos muito de música e somos curiosos por todos os gêneros, não nos limitamos a isso, porque não fazer uma participação internacional? Estamos flertando e pesquisando bastante.

Com Ontem Eu Tinha Certeza (Hoje Eu Tenho Mais) (2024), vocês também foram indicados ao Grammy Latino. Como foi esse momento?
FUFA: Foi mágico, inclusive, a comemoração rendeu um clipe. A gente nem imaginava ser indicado, então a indicação foi o prêmio, por isso que nos demos de presente essa viagem: “Jovem Dionísio parabeniza os ingredientes por essa feitura e comemorem”.
Comemoramos tanto em Curitiba quanto na viagem e depois, foi bom demais. Foi mais legal essa festa do que a premiação em si, acho que os brasileiros sabem fazer festa melhor que os americanos, somos mais animados [risos]. Mas valeu demais a indicação, ficamos felizes que nosso trabalho está chegando em algum lugar, que as pessoas estão gostando e entendendo. Não é só a gente que está sacando, mas também as pessoas da academia que deram um check e falaram: “bom disco”. Alegria imensa.
Vocês têm uma playlist de viagem/turnê? Qual música não pode faltar na estrada?
FUFA: Boa pergunta. Acho que essa playlist vai mudando, tem algumas músicas que sempre tocam, mas ela está mudando. Nessa última turnê, não tivemos muitas oportunidades de sentar e escutar música juntos, foi mais vivendo e tocando [risos].
BERNARDO: Não temos uma playlist fixa, geralmente alguém fica comandando, mas uma música que sempre tenho colocado antes do show e a galera gosta é “Superstition”, do Stevie Wonder. É ótima para aquecer.