Marcos Almeida inicia tour de 10 anos de carreira; leia faixa a faixa de “Calado”

22/08/2025

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Por: Erick Bonder

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22/08/2025

O cantor e compositor mineiro Marcos Almeida, ex-integrante da banda Palavrantiga, iniciou as comemorações de dez anos de carreira com seu novo álbum Calado, lançado em 20 de março. A faixa homônima ganhou clipe junto com o anúncio da nova turnê do artista, que realizou os primeiros shows em Belém, nesta semana.

Marcos ainda rodará o Brasil por Belo Horizonte (28/8), Curitiba (29/8), São Paulo (25/9), São Luís (16/10), Fortaleza (25/10), Salvador (31/10) e Recife (1/11). Nos shows, o cantor apresentará canções de seus discos solo e do antigo grupo.


Com coprodução e arranjos de Wanderson Lopez, o álbum flerta com o rock e o pop, com uma visão contemplativa frente à existência –“Calado” quer dizer “em silêncio”, mas também é uma peça de navios que dá equilíbrio às embarcações.

A metáfora marítima é presente na inspiração do conceito do disco – que passou pela leitura da biografia de Tamara Klink – e no nome das faixas: “Correnteza”, “Ventos”, “Procura”. A faixa “Barco” incorpora o sample do mar e de uma buzina de navio como interlúdio.

Ligado à música gospel, o artista faz de sua obra uma forma de conectar-se com a espiritualidade, mesmo que a religião não seja tema central no novo trabalho. Os arranjos com violões e pianos trazem às canções um tom contemplativo, somados à voz potente de Marcos.

O cantor preparou para a Noize um faixa a faixa exclusivo do seu novo álbum. Confira. 

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1. “Calado”: Na pandemia, pela quantidade enorme de ruído e estresse cognitivo, causado pelas redes sociais, pelo debate público muito acirrado e violento, intuitivamente percebi que a gente precisava de um esconderijo, de ir para um subsolo. Eu fui pescar com meu filho Joaquim e observei que os barcos também têm essa dimensão escondida, que eu não sabia o nome, mas vim a descobrir que se chama “calado”. No processo de produção, a música veio depois. Cheguei com uma lista de 130 versos e fui cortando. Era uma lista enorme de não dualidades. Os versos têm pares que não são excludentes porque estou falando de uma estrutura que é inteira, que é o barco. O tema é o barco, o que eu faço, contudo é focar focando em uma dimensão dele que é a que sustenta a embarcação: o calado.

2. “Barco”: É o som da buzina de um navio. Desde o começo da produção, já sabia que queria uma faixa assim. A primeira vez que eu vi isso de muito pertinho foi fazendo a volta à Ilha de Vitória de canoa. Era a sétima vez que eu remava na vida, eu estava muito cansado. Saí da praia da Sereia, passei atrás do Farol, debaixo da Terceira ponte, e quando tô chegando em Vitória, com a galera remando cada um na sua canoa, veio um navio gigante entrando, em direção ao porto. Soltou a buzina, todo mundo teve que encostar e esperar. Foi um misto de “sai da frente, seus mané” e “esse é o som do meu descanso”.

3. “Porão”: Essa aí foi onde tudo começou. “Porão” foi a primeira e única música que tinha quando fui conversar sobre o disco. Ainda mexi na letra um ou dois meses depois, mas, quando fechei essa faixa, pensei: é possível fazer um disco. Ela foi a parteira do álbum, mostrou o caminho. A única coisa que tinha era aquela linha de baixo, que o Wanderson pegou e tocou, bem na pegada do que eu estava ouvindo, tipo The Cure, The Killers. Queria fazer uma música com três acordes, que fossem se sofisticando, se descaracterizando. E aí, quando ficou pronto, já tinha ali essa ideia de trilha, de clima, texturas que direcionaram a estética do álbum.

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4. “Brincar”: É o meu momento lúdico, cara. Quem dera eu pudesse só tocar e cantar. Perguntam se eu vivo de música, mas pra chegar num show, tem um monte de coisa: redes sociais, imprensa, reuniões. Então, tocar virou minha terapia, o momento que reservo pra mim, com meu instrumento, pra compor, brincar. Só consegui isso depois de respirar, refletir, admitir que música é a primeira coisa na minha vida, não pode ser um adendo. Essa canção provoca isso: o que dentro da vida te chama pra mais vida? É um convite, como bandeira branca, como recreio no meio da guerra. A música cria esse espaço lúdico, onde ninguém precisa concordar ou discordar, apenas brincar.

5. “Gente”: O disco já estava praticamente pronto, mas sentia falta de mais uma música. Eu já tinha a ideia do verso: “não chame de impuro o que Deus purificou”. Um dia, fomos numa pizzaria com a banda e uma moça nos entregou aqueles rolinhos de mensagem bíblica. Na mensagem que abri, tinha um texto do livro de Jeremias que conversava direto com esse verso. Depois disso, escrevi o restante da música, gravei e mandei pro Wanderson e o Gabi (baterista do disco), que se encantaram pela ideia. No estúdio, sentei ao piano e toquei a guia que se tornou a base do arranjo. 

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6. “Correnteza”: É uma ideia antiga, autobiográfica. Queria contar a história de uma menina, que conheci no Norte do Brasil,uma cena que vivi como espectador: ela sai de um culto inesquecível e enfrenta uma depressão pós-culto. De quem tem uma experiência mística e fica meio imprestável pro dia a dia. Quis tratar dessas sensações. A música começou com os versos, depois veio o refrão. Sabia que ia ser meio Bob Dylan, meio Zé Ramalho, Almir Sater, Elomar. Quando terminei, mostrei pro Wanderson e ele respeitou esse caminho. Gosto muito do refrão, do falsete. Ela conta a história de uma menina chamada de santa ou doida, deslocada, chocada entre os sons do templo e os sons da rua. Não é assim com quem quer ser santo no meio do mundo? 

7. “Começo”: É uma canção de amor mais madura. Talvez de alguém que já consegue ver as camadas dessa relação com o seu amado ou a sua amada, que passa pela paixão, pelo desejo, pela fé, mas também por expressões mais sofisticadas e desafiadoras para quem vive uma relação mais longa. O clipe que o Renan Benedito fez para a música capta tudo isso: uma canoa com duas pessoas, ora se abraçando, ora se afastando, mostrando esse dilema do casal. Nele brinco com a ideia bíblica de que o dia começa na tardezinha, na virada do dia. Daí a ideia do verso de que a nossa vida amorosa seria outra se fosse do fim até o começo. Tarde e manhã. Mas é também uma música sobre o quão misteriosa é a pessoa que amamos; “conheço bem a sua rua, mas não sei seu endereço”. Taí o segredo das relações duradouras; o mistério não tem fim. 

8. “Leve”: Aqui, achei que seria interessante tratar essa coisa do peso e do pecado. A gente foca muito no pecado, mas se a gente começasse a pensar também na distinção que o texto bíblico de Hebreus 12 faz entre peso e pecado. Ficava lembrando desse texto e pensando nisso como brasileiro. O que é que na minha vida é pesado? Então fui construindo isso na canção. Além disso, tem um contexto da minha aproximação com a galera do rap: Alves, Cesar MC, Noventa. Comecei a ouvir muito esses caras pra tentar ser mais ligeiro no canto. Também é bom lembrar que ela surge depois de eu retomar alguns estudos de métrica, de versificação. Na hora de escrever, deixei fluir, mas é um texto que brinca com o ritmo e com a rima que não está na última sílaba, mas sempre na penúltima. Leve, além de toda a mensagem polissêmica, é também uma mostra das possibilidades infinitas da palavra escrita. 

9. “Pássaros”: Mandei uma trilha de piano gravada no iPhone para o Wanderson. Ele falou: vou usar. Foi recortando e pensando uma paisagem sonora, usando pedal de uma nota, selecionando algumas frequências e montou outra track. Ficaram três tracks minhas tocando. Tecnicamente, identificamos algumas frequências nesse take, ruídos do lugar onde eu estava tocando e, de vez em quando, passava por umas notas estranhas da tonalidade. O take tinha uns 8 minutos, era enorme, então achamos um trecho que se repetia e fazia sentido.

10. “Ventos”: Foi logo depois que eu fiz uma série de anotações do livro da Tamara Klink. Ela falava de navegar num lugar onde as cartas não refletem mais a realidade, por causa do degelo. Isso me soou muito bonito, muito próximo da nossa vivência humana. A gente tem um mapa, mas quando vai lá, é outra coisa. É igual músico com partitura. Tem gente que acha que partitura é a música, mas não é. O mapa é feito de indicações precárias do lugar real.Para conhecer um lugar, você precisa ir até ele.  Peguei os versos que criei em cima das leituras e fui pro piano. Ela é toda desengonçada, não tem métrica clássica, bem diferente do processo de Leve, por exemplo. Nesse sentido, ela tem um parentesco com “Correnteza”. Versos livres, soprados pelo vento. 

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11.Constelações”: Eu tinha feito vários estudos em casa, intuitivamente, tentando chegar nessa estética do mar, brincando com o piano, com o sentimento da ondulação, do movimento das águas. Mostrei uma dessas faixas pra ele (o Wandreson) e decidimos usar na música “Ventos”. Era uma trilha instrumental meio maluca, com momentos de tranquilidade, outros que parecia uma  revoada de pássaros. Ele entendeu tudo sem eu precisar explicar e transformou em paisagem sonora. A gente recortou a canção como uma faixa e deixou essas “rabiolas” no início e fim como introdução e conclusão de Ventos, sabendo que quem ouve percebe que é tudo uma coisa só.

12. “Procura”: Foi uma das primeiras músicas, junto com “Porão”, que fui entregando à medida que avançávamos na produção. Comecei a escrever pensando no vício  das redes sociais, essa sensação de procurar algo que não está ali. Passamos horas na tela sem saber mesmo o porquê. A frase ‘o que você procura não está aqui’ veio enquanto eu rolava o Instagram sem objetivo. A música virou uma conversa entre dois amigos, falando de um barquinho no porto, indo para longe do império das notícias e da sociedade do cansaço, muita informação. Usei a imagem da voadeira, que conheci em Manaus, um barquinho típico dos rios. É uma canção forte, de amigos que falam daquilo que move a gente.

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22/08/2025

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