A “princesa do underground”, como diz em “Hot”, Mia Badgyal soma mais de oito anos na cena da música eletrônica brasileira. Destaque da noite paulistana, Mia lançou recentemente Mucho Sexy (2025). O álbum, para além de ser um manifesto à sua sexualidade como mulher trans, é uma vitrine dos melhores talentos que o underground mundial tem para oferecer.
“Sempre procuro entender que fase que a gente vive na nossa cena e aí o que eu fiz foi isso, sabe? Vi quais sonoridades seriam algo que eu queria trazer para o meu universo e fui fazendo esses convites”, explica a artista. E esses convites foram estendidos a um panteão de artistas que têm modelado a cena eletrônica atual, não só no Brasil, mas no mundo.
Umru, Cyberkills, Clementaum, Ramemes, Carlos do Complexo, CARLO, Baby Plus Size, feline, Bbynito e dj g2g são as parcerias na produção, enquanto Katy da Voz e as Abusadas, Irmãs de Pau, WES, Lia Clark, MC Morena, Lua de Santana, MC Binn e MS NINA fazem parte nos vocais. Com co-produção geral de Fuso!, outro nome de destaque na cena paulistana, o novo álbum de Mia Badgyal é uma narrativa sobre a sua cena – para além de uma narrativa sobre si própria.
Autoestima é mucho sexy
Após quase uma década de carreira e destaques como abrir o show de Charli xcx e tocar ao lado da diva britânica em São Paulo, Mia Badgyal fez uma marca inegável no underground – e na música no geral. Conhecida por sua mescla de música eletrônica, pop e ritmos latinos, a artista traz tudo isso somado à bagagem do funk em Mucho Sexy (2025).
“Sempre morei na periferia e lembro que, quando eu era adolescente, meio que escondia isso. Mas, a chave virou para mim quando eu comecei a entender que o funk poderia ser uma mudança social. Quando comecei a ver as travestis que estavam saindo da prostituição para viver só de música, foi quando me reconheci naquele espaço”.
Esse abraço ao funk é um dos fundamentos do novo disco da cantora, marcando presença em diversas formas ao longo do projeto — além de simbolizar um abraço a uma parte de sua história de vida. Inspirado por suas vivências e sua autoestima, Mucho Sexy (2025) representa isso mesmo para Mia: foi a compreensão dela mesma que abriu caminho ao amor-próprio.
Por baixo das batidas para pista e dos momentos explícitos nas letras, o novo álbum é uma prova da autoconfiança de Mia Badgyal.
“Na transição, você demora para se amar e se entender. Mas, nas vivências, fui vendo que eu não vou piscar hoje e aparecer com silicone, com frontoplastia, eu não vou piscar e estar toda feita. Tenho que me aceitar como eu sou, porque senão vai ser horrível viver essa pele que eu vivo”
“Acho que o que me fez ter mais caneta foi realmente ter tido essas vivências”, ela aponta, acrescentando que, segundo ela, esse disco representa um amadurecimento em todos os aspectos em comparação com seu primeiro, Emergência (2023).
Para Mia, Mucho Sexy (2025) a apresenta como uma compositora, vocalista e produtora amadurecida, com uma nova visão sobre a vida e com uma vontade de criar um projeto diferente. Inspirada por Funk Generation (2024) de Anitta, e Motomami (2022) de Rosalía, além de Charli xcx pré-Brat (2024), Mia ficou dois anos construindo Mucho Sexy (2025), que chega como uma homenagem a si mesma.
“Tomo essa narrativa para mim”
“Somos nós as travestis que somos objetificadas, somos nós que somos vistas como segunda opção. Porque então eu não posso, no meu mundo, nas minhas músicas, falar que sou eu que tô no comando? Que eu que dito como você vai me tratar? Na sociedade, na cama, na nossa relação”, diz Mia Badgyal sobre o significado político de suas músicas.
Produtora de música eletrônica, funk e pop, Mia exprime que seu novo álbum também carrega muito mais significância do que as pessoas podem achar. Ao contrário da visão geral sobre esses gêneros musicais, a artista argumenta que nada sobre sua arte é só o que está na superfície. “Será que é só p*taria mesmo, sabe? Será que você não parou para pensar que as travestis estão tomando para si essa narrativa e tomando controle da objetificação? Nesse álbum, eu tomo essa narrativa para mim”, afirma Badgyal.
Usando os ritmos pelo qual é apaixonada para solidificar sua presença na cena e para brincar com seu posicionamento no espaço político como pessoa trans, Mia explica que Mucho Sexy (2025) é ela no seu eu mais sem remorso. “Eu não tô nem aí para pedir licença para falar sobre mim, é sobre mim e ponto, entendeu? E eu acho que quem é trans, principalmente, e escuta as minhas músicas, se identificar muito com isso”, finaliza.