O Podcast Afiadas mergulha na história das mulheres que estão nos bastidores da música. Em episódios semanais, de filmmakers a fotógrafas, os holofotes estão apontados para elas. Idealizado pela ONErpm e com apresentação da jornalista Adriana Barros, o primeiro episódio foi ao ar no dia 15/9.
A estreia ficou por conta da filmmaker Larissa Zaidan — diretora do curta-metragem que acompanha o álbum Beleza. Mas agora a gente faz o que com isso? (2025) de Rubel, título #100 do NRC e gravado em 35mm (assista na íntegra aqui).
A primeira temporada ainda trará entrevistas com Angela Johannsen (Editora), Manuella Sys (Produtora de Eventos), Sofia Pellegrini (Professora de Música), Roberta Siviero (Técnica de Som), Nico (Instrumentista), Juliana Pedutti (Fotógrafa), Bia Wolf (Roadie), Carol da Luz (Diretora de Imagem), Carolina Andrade (Compositora), Nanda Tsunami (Artista) e Priscilla Cardena (Radialista).
A Noize conversou com Adriana Barros, jornalista da TV Cultura e apresentadora do podcast, e Iasmine Amazonas, diretora de Marketing Institucional da ONErpm, sobre o projeto. Leia abaixo:
Como foi feita a seleção das convidadas desta temporada?
IASMINE: A seleção foi um processo verdadeiramente inspirador e colaborativo. Reunimos toda a nossa equipe institucional, composta por homens e mulheres, e cada membro contribuiu com nomes de profissionais femininas notáveis que admiravam e cujas trajetórias sabiam que fariam uma diferença significativa.
Foi gratificante testemunhar o envolvimento de todos, que, com entusiasmo, enalteceram as conquistas dessas mulheres e “venderam” com orgulho suas histórias. A energia no ambiente era contagiante, transformando a seleção em uma verdadeira celebração: uma equipe diversa unida para reconhecer e exaltar talentos femininos que merecem muito mais visibilidade no cenário musical.
Adriana, você que está de frente nesse projeto e acompanhando de perto os bastidores da música. Desde o início de sua carreira até agora, o que mudou na representatividade feminina nesse meio?
ADRIANA: Posso afirmar, com segurança, que a representatividade feminina mudou de forma significativa. Nos últimos anos, os espaços para as mulheres aumentaram de maneira notável, e é impossível não perceber que hoje vemos muito mais mulheres, especialmente em papéis que antes eram dominados por homens.
Há 35 anos, quando iniciei minha jornada no rádio, a presença feminina era bem menos expressiva. As poucas mulheres que se destacavam muitas vezes enfrentavam uma batalha árdua para serem ouvidas. Reconhecimento era algo muito distante da nossa realidade. Hoje, embora a luta continue, estamos ocupando cada vez mais espaço não apenas como cantoras e instrumentistas, mas também na produção musical, na engenharia de som, na direção artística e em outras funções técnicas.
Essa presença maior é reflexo direto do estudo, trabalho e da perseverança de muitas mulheres que abriram caminho para as novas gerações. E o Afiadas acredita muito nessa formação de novas profissionais e na chegada de mulheres cada vez mais qualificadas ocupando os espaços de maneira efetiva e respeitada.
Você sente que essa nova geração de profissionais é mais acolhida? Quais são os próximos passos para ampliar o protagonismo feminino no setor musical?
ADRIANA: Sinto que há um movimento crescente e mais consciente para acolher essa nova geração de profissionais no setor musical, embora o nível de acolhimento ainda varie. Avanços importantes incluem a maior visibilidade de talentos femininos, o surgimento de programas de capacitação de mulheres em funções técnicas, de produção e gestão, além da criação de redes de apoio que oferecem espaços seguros para troca de experiências.
Pensando em ampliação do protagonismo feminino, acredito que é necessário estruturar bem os próximos passos. Aí falamos em investimentos na educação e capacitação específicas para mulheres em áreas técnicas e de gestão de carreira, desmistificando a ideia de “funções masculinas”. Muitas das profissionais que conversei no Afiadas buscaram essas informações por conta própria e, mesmo com a experiência adquirida ‘na raça’, ainda percebem lacunas na oferta de cursos e formações para o aprimoramento contínuo de seus conhecimentos.
Outros passos essenciais incluem o combate ao assédio e a ambientes tóxicos, com políticas claras e canais de denúncia eficazes. É fundamental também incentivar a colaboração e a criação de redes de apoio entre mulheres, desconstruindo estereótipos para reforçar uma mudança cultural que valorize o talento e a contribuição feminina em todas as esferas da indústria musical.
Adriana, quais foram as descobertas mais interessantes nos bate-papos com as convidadas?
Em alguns desses bate-papos, uma das descobertas mais interessantes e, ao mesmo tempo, preocupantes, foi perceber que muitas profissionais ainda ponderam em afirmar seu domínio sobre suas próprias funções, como se duvidassem de sua própria capacidade. Conversei com mulheres incríveis e de muito destaque no mercado que se sentiam visivelmente envergonhadas em falar de suas conquistas, habilidades e qualidades.
Acredito que esse comportamento reflete a realidade de uma constante descredibilização que mulheres enfrentam no setor, levando-as a internalizar a dúvida sobre seu próprio valor e expertise. O impacto do acolhimento logo na chegada delas nas gravações também me chamou muito a atenção.
A ONErpm, com sua dedicação aos projetos, ofereceu um camarim super acolhedor, com café e comidinhas para as convidadas. A surpresa era evidente na maioria delas, que manifestavam espanto com perguntas como ‘nunca tive um camarim’ ou ‘isso tudo pra mim?’. Essa reação tão genuína revela o quanto a mulher, habituada a se doar e a fazer pelos outros, muitas vezes não sabe como lidar ao receber um tratamento amigável, que deveria ser regra.
Era como se não se julgassem merecedoras daquele espaço e reconhecimento tão especial. E, claro, a sensibilidade feminina desenvolvida nas funções. A sensibilidade feminina é um diferencial valioso no setor musical. Essa percepção aguçada, empatia e inteligência emocional permitem uma compreensão mais profunda das nuances artísticas, das relações e do público. Muito longe de ser fraqueza, essa sensibilidade é um fator que enriquece os resultados e experiências.
O podcast, além de trazer esse tom informativo, pretende mapear as mulheres da indústria musical, criando uma rede de apoio e profissional entre elas. Como vocês pensam em manter essa rede ativa após o fim da temporada? Há planos de desdobramentos offline, como encontros ou workshops?
IASMINE: Esta pergunta toca no cerne do nosso propósito e na visão de longo prazo para o projeto. Nosso objetivo primordial é desmistificar a percepção de que há uma escassez de profissionais femininas na indústria musical, combatendo a narrativa comum de que “não existem mulheres trabalhando aqui”. Queremos provar ao mercado que essas profissionais não apenas existem, mas estão prontas para serem contratadas e, mais importante, para inspirar uma nova geração de talentos.
Para manter essa rede vibrante após o término da temporada, nosso blog terá, em uma de suas partes, um catálogo de referências, apresentando o perfil dessas mulheres, redes sociais e um resumo das valiosas contribuições de cada convidada no podcast. Assim, facilitaremos o acesso a essas profissionais para quem busca expertise feminina no setor.
Além disso, estamos empenhados em expandir essa iniciativa para o ambiente offline, com planos concretos para a realização de encontros presenciais, workshops e outros eventos que promovam a troca de experiências e fortaleçam ainda mais essa comunidade.
Vocês estão dando espaço para profissionais que sempre estão do outro lado da câmera, de técnicas de som a radialistas. Qual a importância de colocá-las nos holofotes?
ADRIANA: A ONErpm é uma companhia que sempre está observando essas profissionais e tem consciência da importância delas para o mercado. Dito isso, o Afiadas, primeiramente, visa reconhecer e valorizar talentos que são pilares fundamentais para a qualidade e o sucesso de qualquer projeto musical. Ao destacá-las, quebramos o ciclo da invisibilidade e combatemos a noção de que certos papéis são predominantemente masculinos, inspirando outras mulheres a buscarem essas carreiras.
Em segundo lugar, essa iniciativa promove uma representatividade essencial. Quando o público e, principalmente, as novas gerações veem mulheres nessas posições de destaque, elas encontram referências e se sentem encorajadas a sonhar e trilhar caminhos que antes pareciam inviáveis.
Isso não só amplia as opções de escolhas profissionais para as mulheres, mas também enriquece o próprio setor com novas perspectivas, criatividade e abordagens que só a diversidade pode oferecer, levando a produções mais inovadoras e uma indústria mais equitativa e completa. Estou convencida de que o ‘Afiadas’ fará com que o público entenda, de uma vez por todas, o papel fundamental das mãos femininas em todas as áreas do mercado musical. A partir daí, assistir a um show, por exemplo, nunca mais será a mesma experiência.
Há planos para a próxima temporada? O que vocês têm em mente?
IASMINE: Absolutamente! Este projeto está longe de terminar; ele já se tornou uma parte intrínseca da nossa identidade e dos valores que defendemos como empresa. A resposta tem sido esmagadoramente positiva, com profissionais já manifestando interesse em participar e compartilhar suas experiências. Para a próxima temporada, o público pode esperar uma exploração ainda mais aprofundada de novas profissões dentro da indústria musical, conversas ainda mais honestas e sinceras, e, sem dúvida, uma dose renovada de inspiração. Nosso compromisso é continuar ampliando este espaço, dando voz a uma diversidade ainda maior de talentos e destacando a riqueza e o potencial que existem em nossa indústria.