Em “Se eu pudesse, te beijava até a voz”, Amandona mergulha no amor entre mulheres

12/08/2025

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Por: Revista NOIZE

Fotos: Divulgação/Sarah Leal

12/08/2025

Se apaixonar é como estar debaixo d’água, e Se eu pudesse, te beijava até a voz (2025) é a trilha sonora perfeita para esse momento. O primeiro álbum de Amandona chegou aos streamings em julho, consolidando uma trajetória já consistente na música mineira.

Mesmo antes da estreia, os belo-horizontinos podem reconhecer esse nome. Das apresentações em barzinhos à rua, Amandona tem um bloco de carnaval próprio na cidade, além de comandar o Abalo-Caxi — que já mobilizou 100 mil pessoas — na capital mineira.

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A metáfora do amar-mar é usada também por foi usada por Luedji Luna em sua trilogia aquática — Bom Mesmo É Estar Debaixo D’Água (2020) (#54 do NRC) e Um Mar Pra Cada Um, (2025) (#99 do NRC) —. O que essas obras compartilham é a metáfora para amar e se entregar, perder o ar e mergulhar no outro.

Em Se eu pudesse, te beijava até a voz (2025), o princípio é parecido, mas celebrando o amor entre mulheres. Entre as referências, é impossível não citar as clássicas da canção lésbica brasileira, como Cássia Eller, Adriana Calcanhotto, Angela Rô Rô e Ana Carolina.

A produção é assinada pela também mineira Luiza Brina, cujo álbum Prece (2024) está disponível no NRC+. Além de produzir, Luiza participa da faixa “Eu Gosto Mesmo É De Beijar”, e ela não é o único feat, também cantam Letrux – “Se Eu Soubesse Como” — e Juliana Linhares — “Te Quiero”.

“É um álbum com alma de MPB contemporânea e uma pitada alternativa”, diz Amandona sobre sua estreia. Um indie pop que não tem medo de levantar a bandeira das emocionadas, é dramático, mas, nem por isso, menos leve e dançante. Leia (e ouça) Se eu pudesse, te beijava até a voz (2025) faixa a faixa:

“Se Eu Soubesse Como”: é, pra mim, a faixa mais rica do disco — e a mais elegante também. Ela é toda construída em cima de um piano de cauda lindamente tocado pelo Antônio Guerra, que cria uma atmosfera melancólica e sexy ao mesmo tempo. E a linha de baixo que a Luiza Brina gravou é, sem exagero, uma das melhores que já ouvi — ela conduz o som e dá um corpo pra música de um jeito luxuoso demais! Assim que eu e Brina chegamos num lugar de arranjo que nos emocionou, pensamos: precisamos mandar pra Letrux! Tem tudo a ver!

Já imaginava a voz falada dela ali, com aquele timbre firme, intenso e sensual. A faixa já me tocava só com minha voz cantada, mas com a presença da Letrux, ela virou outra coisa — uma coisa ainda melhor! Uma espécie de promessa feita por um telefonema ou numa mensagem de áudio. O fim da faixa registra um comentário sincero e bem-humorado da Letrux — um fecho inesperado que alivia e humaniza a intensidade da canção.

Julgo que esse humor afiado e espontâneo é uma marca comum entre eu e ela [risos]. Adoro a autenticidade dela e tô me sentindo o máximo de ter ela no disco (tipo assim: essa pessoa muito legal tá participando comigo, talvez eu também seja muito legal!). O disco foi inspirado na sonoridade de grandes artistas lésbicas e, nessa faixa em específico, no trabalho de Angela Ro Ro.

“Senorita”: foi a última música a entrar no disco — e talvez a mais “diferentona”. É uma declaração de amor cantada em “portunhol”, com letra e melodia simples que comunicam uma paixão com leveza e humor. Eu compus essa faixa enquanto a Helena estudava espanhol, porque precisava da fluência pro outro trabalho dela. O arranjo mistura música latina com pagodão baiano — dois universos que amo e que têm tudo a ver com meu envolvimento afetivo e artístico com o Carnaval de BH. Gosto muito do timbre meio maluco que a Luiza e o Luca escolheram para as guitarras — dá uma onda!

“Quando Vi Já Fui”: nasceu daquele momento clássico em que a gente jura que vai viver a vida de solteira, sem se envolver, e quando percebe… Já foi, já se apaixonou, já pagou a língua, risos. A música conta a história do meu primeiro date com a minha empresária e namorada, Helena — ocasião em que disse que eu não tinha espaço para envolvimento emocional (claro que com jeitinho, numa conversa leve). “Lê” é o apelido da Helena na família, e por isso o refrão é cantado assim.

Essa música foi um presente pra ela. Durante a pandemia, compus muitas canções personalizadas para as pessoas darem de presente, como forma de fazer uma grana, e como a Helena é daquelas pessoas difíceis de surpreender (porque é tão proativa que já comprou tudo o que quer, risos), resolvi dar um sambinha feito por mim. Não fiz pensando em gravar a música, mas achei que fazia sentido que ela estivesse, até porque a Helena amou (e eu também!).

“Moça Que Dança”: nasceu quando me apaixonei por uma dançarina. A situação era: ela dava uma fugidinha de mim e eu queria muito sair com ela mais vezes. A letra traz umas metáforas que, na minha cabeça, fazem sentido e narram nossa história — agora vamos ver como chegam para as outras pessoas. A música tem esse clima mais leve e com um balanço gostoso e o arranjo acompanha essa intenção mais dançante, com referência mais uma vez com a minha relação com o carnaval e ritmos como o afoxé.

Uma curiosidade para dividir: eu fui na casa dela cantar essa música olhando pra ela (sou romântica) como quem pergunta: “certeza que não vai me dar uma chance direito?” e depois dessa fase mais apaixonadinha da nossa história, ela permanece na minha vida e é um grande amor que tenho a sorte de ter por perto (muito coisa de sapatão ser amiga das ex, né? – bom demais).

“Te Quiero”: é uma das que mais gosto do disco. Adoro a dramaturgia da letra e como o arranjo acompanha com uma certa tensão, mas também com sensualidade. É meio que um desabafo do meu desejo — compus num momento em que vivia um relacionamento sólido, mas me sentia um pouco sufocada. Quando meu pai morreu, veio forte a cobrança por liberdade… Porque eu lembrei que a gente vai morrer, sabe? A participação da Juliana Linhares é um verdadeiro sonho realizado.

Desde a primeira vez que a vi cantando (chocante! lembro de ter ficado assustada! pra mim talvez a maior voz da música brasileira atual), fiquei imaginando: e se um dia ela cantasse “te quiero” com esse sotaque charmoso? Fora isso, na minha cabeça a voz dela combina com sanfona, sabe?

E essa é uma música que Luiza e eu queríamos dar protagonismo pra sanfona! No dia que a gente foi gravar junta eu queria gritar! Fiquei feliz demais em ouvir minha música na voz dela! Acho que combinou demais! Nosso trabalho ganhou muito com a interpretação dela!

“Tão Sem Graça”: é a música de término do disco. É aquela pra dar uma sofridinha de leve, com uma “cafonice” proposital na letra, que diz tudo de forma bem dramática, bem doloridinha. É basicamente voz e violão, do jeitinho que eu amo. Sou fã de um voz e violão bem feito. Mas o que mais me emociona nessa faixa é o solo de trompete do William Pajé no final — toda vez que escuto, me dá vontade de apertar os olhos e só sentir. Fiz essa música com a ajuda da Helena, inspirada em nomes como Adriana Calcanhotto e Ana Carolina.

“Sereia”: é a única faixa do disco que não é inédita. Ela já foi lançada numa outra versão, quando comecei a produzir o disco com outra pessoa — na época, seria a música de abertura. Mas o caminho estava indo pra um lado mais pop, que não refletia tanto o que eu queria. Quando comecei a trabalhar com a Luiza, quis muito trazer “Sereia” de volta, mas com uma roupagem que me representasse mais.

Sugeri um voz e violão — mas acabou que não foi simplesmente um voz e violão: foi um violão Luiza Brina, né? O resultado ficou muito mais rico e sofisticado. Na minha cabeça, o violão imprime bem o movimento do mar e casa lindamente com a estética da letra. Ele também me inspirou a cantar com mais emoção e fez muito mais sentido, porque essa música fiz pra Helena. Compus logo depois de uma viagem à Bahia, em que não fomos juntas… Mas voltamos juntas, muito apaixonadas.

“Filosofia”: é uma canção que fiz para uma pessoa que se chama Sofia, com quem tive um relacionamento que me fez crescer muito. É uma poesia onde comparo o amor à maré — sempre em movimento, com suas fases e seus riscos. O arranjo dessa faixa é um dos meus preferidos do disco: original, inventivo, com guitarras de timbre brilhoso que me pegam de um jeito especial. Além disso, pra mim, ele dá uma sensação de que a música está “remando”, o que faz todo sentido com o que a letra propõe.

“Eu Gosto Mesmo É De Beijar”: eu costumo dizer que beijo bem, risos. Falo isso pra todo mundo — porque é verdade e porque faz parte do meu marketing pessoal. Inclusive, tenho uma pochete que levo pra cima e pra baixo com essa frase escrita, e acho que combina com essa minha personalidade engraçadinha e expansiva. Adoro o arranjo dessa faixa! Ele tem muito da sonoridade do disco Maré, da Adriana Calcanhotto, que foi uma das referências que usamos na construção do disco.

A Luiza Brina produziu essa faixa pensando no que ela chamou de uma “paisagem sonora”: a harmonia tocando num lugar e um bloco de carnaval passando ao fundo. Quando ela me trouxe essa ideia, amei por vários motivos. Primeiro porque me identifico muito com o carnaval. Depois porque achei muito original. E, claro, porque carnaval combina com beijo na boca.

A letra também foi inspirada naquele meu momento de querer liberdade, e, obviamente, de estar apaixonada. Desde o início, eu queria que a Luiza fosse uma das participações do disco. Sou muito grata por ela ter topado produzir, pensar tudo comigo, misturar as tintas.

Disse pra ela que podia escolher a faixa que quisesse, porque o mais importante era que ela estivesse. Achei chiquérrimo que ela escolheu essa. Acho que foi porque ela ficou feliz com o que construímos juntas nos arranjos. Eu amo tudo que a Luiza faz, e amo a voz dela — acho que ela trouxe um macio muito gostoso pra música, que combina muito com ela.

“Meu Vício”: é o primeiro lançamento do meu disco de estreia. Como foi com o disco inteiro, a produção é da Luiza Brina, que admiro muito e que arranjou e lançou um dos álbuns mais marcantes e inventivos de 2024. Essa música é, sem dúvida, uma das que mais gosto no disco. Além de ter contado com a parceria na composição da Helena — minha namorada e também minha empresária —, o que deixa tudo mais significativo e especial, eu adoro como a melodia inspira a cantar alto.

Também me identifico muito com a drasticidade das palavras que usamos. Quem me conhece sabe: eu realmente sou uma pessoa com a energia dessa música. Por isso, ela soa pra mim quase como um desabafo,. Acho que muita gente pode se identificar com essa energia de sentir tudo muito. Outra coisa que amo sobre a música são as guitarras que o Luca Trezza gravou.

Pra mim, elas têm tudo a ver com o som que eu e ele fazíamos quando começamos a tocar juntos nas primeiras apresentações, lá em 2009 — e até hoje ainda é essa referência que nos conecta — o que me traz uma nostalgia gostosa que dá vontade de escutar a música no repeat.

A produção segue a estética intensa e sensível que marca essa nova fase da minha trajetória e, nessa faixa, com uma sonoridade inspirada nos anos 80, misturando timbres orgânicos e contemporâneos. “Meu Vício” tem alma de MPB contemporânea com uma pitada alternativa. Tem uma atmosfera meio blues, meio rock, meio “Ritaleestica”, e a letra escancara o quanto meu hiperfoco rouba a cena quando me apaixono.

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12/08/2025

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