“Perdoem o meu português com sotaque nova-iorquino”, disse Samara Joy no palco do Teatro Cultura Artística na última quinta-feira, 31/7. Pela segunda vez no país, a cantora se apresentou na capital paulista e seguiu para o Rio de Janeiro, onde abriu a programação de shows de jazz do Queremos!. Em setembro, a plataforma trará Jacob Collier e Snarky Puppy.
Com a casa cheia na noite fria paulistana, a artista apresentou um repertório costurado por Duke Ellington e Thelonious Monk, com clássicos nacionais – “Flor de Lis”, de Djavan, por exemplo, está disponível nas plataformas de streaming.
Ela ainda incluiu “Minha Saudade”, de João Gilberto e João Donato, – canção que planeja gravar em breve –, “Chega de Saudade”, de Vinicius de Moraes e Tom Jobim, e fez referência aos Tincoãs com “Cordeiro de Nanã”. Do terceiro trabalho, Portrait (2024), apresentou “Day by Day” e “No More Blues”.
“O jazz e a bossa nova parecem ser acolhidos e tidos em alta conta pelos brasileiros. O jazz americano nem sempre é respeitado como deveria pelo público americano, mas espero que possamos mudar isso”, reflete Samara Joy sobre as tradições musicais entre os dois países.
Vencedora de cinco Grammys, aos 25 anos, a cantora é um dos nomes que estão adicionando frescor ao estilo. Ao longo da noite, fica evidente como sua voz é única, ainda que cada instrumento tenha tido seu momento de destaque, foram nos respiros e silêncios que se percebe o talento como intérprete. Para além da técnica precisa e da ampla extensão vocal, sua entrega carrega emoção em cada sílaba.
A influência familiar a levou aos corais da igreja, e posteriormente estudou jazz na faculdade. A mistura dessas referências a torna única: “Sinto que é uma abordagem natural, porque amo soul e gospel tanto quanto o jazz. Eles são partes iguais da minha identidade musical, então consigo equilibrá-los de forma autêntica”.
No momento, está ampliando o repertório de música clássica e mergulhada nas partituras de Billy Strayhorn. “O que eu gostaria de fazer no futuro é cantar com uma orquestra”, revela a artista. Ainda que aprecie a dinâmica do estúdio, onde consegue brincar com as possibilidades dos arranjos, é no palco que se sente mais à vontade.
Há dois anos, ela está na estrada acompanhada do septeto responsável por azeitar o repertório registrado em Portrait. “A turnê nos deu a oportunidade de construir uma química especial e um repertório desenvolvido para documentar no disco. Isso talvez não tivesse acontecido se não tivéssemos a oportunidade de tocar juntos com tanta frequência. Ter uma banda em que nos conhecemos tão bem é realmente um luxo”, afirma a cantora.
Na escolha do que entra no setlist, conta que mira nos ídolos, como as intérpretes Carmen McRae e Betty Carter. “Gosto de ouvir e cantar músicas que ajudam você a imaginar a história e a letra como em um filme”, reflete sobre a seleção.
Ainda que tenha crescido em um berço musical, foi na maturidade que entendeu qual caminho deveria seguir, quase como se o jazz a tivesse escolhido: “Sempre adorei cantar. Ver minha família se apresentar e cantar com facilidade o tempo todo me fez querer fazer a mesma coisa. Eu ainda não sabia qual gênero seguir. Soube que queria seguir jazz quando o ouvi na faculdade. Senti que podia cantar completamente do jeito que queria, ao mesmo tempo em que era desafiada a absorver um novo estilo.”