Artistas queers criam espaço de acolhimento na cena do forró; conheça

15/08/2025

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Por: Pedro Furlan

Fotos: Divulgação/Thaís Mallon, Ian Rassari, Jefferson Carvalho, Valdinei Souza, Gabriel Sebastian

15/08/2025

O forró é um dos ritmos mais tradicionais do Brasil. Intrínseco à cultura brasileira, o gênero musical está presente em todas as regiões do país, com destaque especial ao seu local de origem: o Nordeste, onde movimenta multidões de fãs com seus grandes artistas, como Aviões do Forró, João Gomes e Calcinha Preta.

No entanto, até mesmo em um ritmo tão abrangente, não são todas as pessoas que se sentiram acolhidas por essa música. Por isso, nos últimos anos, diversos artistas da comunidade LGBTQ+ têm se movimentado para fazer do forró um espaço de diversidade e acolhimento.

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Além do forró

Cantora, compositora e instrumentista, Flor Furacão, travesti brasiliense, mescla as tradições do forró com sua educação erudita para criar seu próprio ritmo: o forró-jazz. “Os corpos dissidentes, as comunidades excluídas e os corpos marginalizados estão se apropriando desses espaços, frequentando, dançando e fazendo música”, afirma.

A artista, que lançou seu EP Forró Jazz do Cerrado (2025) em março, conta que já participou de eventos heteronormativos de forró e, nesses espaços, ela percebe a falta de diversidade. A verdade é essa: muitas vezes me sinto a cota LGBT”, diz Flor: “Mas, nesses eventos, temos essa oportunidade de: beleza, estão me usando de prestação de conta, então, vou chegar lá e quebrar tudo”.

Apaixonou-se pelo forró como forrozeira, frequentando festas do gênero durante todo seu crescimento no Distrito Federal, mas destaca a presença dessa musicalidade em todos os estados do país. A narrativa de crescer com o forró é muito presente em pessoas nordestinas, como, por exemplo, o artista piauiense, residente de São Paulo, Wândalo.

“Minha conexão direta com forró são as minhas origens, o fato de eu ser nordestino, né? A minha paixão vem das minhas origens, é algo que está no meu DNA”, afirma. Crescendo no Piauí, mudou-se para São Paulo em busca de oportunidades profissionais. Wândalo conta que a música foi o caminho que ele encontrou para “me manter vivo e me sentir vivo também”.

Designer gráfico, Wândalo trabalhou com artistas musicais que se tornaram destaques nessa nova era do forró LGBTQ+, como Getúlio Abelha, Pabllo Vittar e LEOA, ex-vocalista da banda Luísa e os Alquimistas. Conta, também, que eles o incentivaram a apostar na carreira musical. Inspirado pelas origens do forró e pela música alternativa pela qual é apaixonado, como Arca e FKA Twigs, o artista criou sua própria versão do forró, debutando em 2023 com um single com um sample de Arca.

Ao longo da carreira como cantor, Wândalo encontrou, como uma de suas casas, o tradicional bar paulistano Funilaria, no qual sempre se apresenta, especialmente na festa Je Treme. A festa se tornou um dos centros do forró em São Paulo. “É uma festa que muita gente vai e a Funilaria lota. Nesse rolê, eu já toquei e já cantei em vários segmentos do forró. Realmente me considero uma pessoa da cultura brega”, explica o artista.

A Je Treme é um dos maiores espaços do forró em São Paulo, mas está longe de ser o único. Dentro da comunidade LGBTQ+, a festa Javali, onde Wândalo também se apresenta, é um grande nome.

Risca Fada

A festa Risca Fada se solidificou como força do forró na capital paulista em seus sete anos de existência, e já levou sua festa para diversas outras regiões do Brasil. Encabeçada por Matheus Marques, Fernanda Tiozo e Hirai Fujisaka, o Baile do Risca Fada começou em 2018 como a festa de aniversário de Marques e Tiozo, mas, organicamente, foi crescendo pela busca por espaços de forró em São Paulo. “É isso que as pessoas querem ouvir. As pessoas estão muito atentas, têm muita sede por esses ritmos. Acho que a gente preenchia de alguma forma uma lacuna na época que a gente lançou a festa”, aponta Marques.

Com o nome inspirado pelas tradicionais riscas facas, a festa foca em ser um espaço de acolhimento para a comunidade LGBTQ+ dentro do forró e abrir espaço para artistas da comunidade tocarem e cantarem — mas, a Risca Fada tornou-se casa de um público extremamente diversificado.

“É até difícil mapear nosso público, porque é muito diverso: tem sapatão, gay, bi, uma galera trans… varia de acordo com a edição e o artista”, afirma Hirai, pessoa não binária, sobre a festa.

O evento também oferece oportunidade para artistas que tocam em bares na capital paulista, inclusive tendo a banda Eliane Melo e Mazinho Teclas como banda oficial da festa. Essa perspectiva de abertura completa vem também da diversidade nos próprios criadores. Matheus se apaixonou pelo forró quando morava no interior de São Paulo, Hirai nas festas de sua faculdade em Minas, enquanto Fernanda tem família cearense, então cresceu com esse ritmo.

“Minha família só fala sobre isso, é um assunto pertinente. Os tios pedem para ser convidados, eles querem estar lá, eles querem dançar. Acho que também tem um vínculo familiar que vai crescendo no meio de toda essa bagunça que é a Risca Fada”, diz Tiozo, que é uma mulher lésbica.

Wanessa Lobato, cantora que já se apresentou diversas vezes na Risca Fada, compartilha dessa experiência. Mulher trans maranhense, Lobato cresceu com o forró na sua família e na sua vida, tendo as vocalistas do forró como suas primeiras divas.

“Companhia do Calypso, Aviões do Forró, sabe? Calcinha Preta, Limão com Mel. Sempre tive muito essa referência das divas do forró, porque quando a gente LGBTQ+ é criança, ainda mais sendo nordestina, sempre estamos procurando as divas, né?”, aponta Wanessa.

Conhecida por criar suas versões em forró de músicas internacionais, Wanessa Lobato tem o apelido de ‘A Safadinha do Forró’, trazendo sua sensualidade nas composições e performances. Mas, nas letras, a artista também faz questão de trazer sua experiência como travesti, deixando claro que o forró também é espaço para contar as histórias da comunidade LGBTQ+.

“Nas minhas músicas, sempre tentei passar uma realidade trans, que é a minha vivência. Fico muito feliz em lançar uma música e várias gatas me marcarem, repostarem. É isso que eu quero”, diz a cantora.

Essa autoexpressão sempre foi a missão de LEOA, ex-vocalista de Luísa e os Alquimistas e artista solo. “É muito legal a gente começar a perceber que o forró tá cada vez mais diverso. E perceber que ele tá no underground, que ele tá no midstream, que ele tem muitas possibilidades de existir e acontecer e que tem muita gente querendo esse tipo de som em suas diversas formas”, diz ela.

Leia também: Ex-Luísa e os Alquimistas, LEOA emerge da música potiguar e do brega para criar pop singular

A artista, que recentemente lançou o álbum Original Malokera (2025), traz sua experiência de uma década para sua musicalidade — sempre inserindo um pouco de forró dentro do mix. Como mulher potiguar, LEOA — que também é sócia da festa Brega Dance Club — aponta a importância dessa nova geração do forró e declara a necessidade de abrir espaço para que todas as histórias possam ser contadas.

“O forró é uma cultura que tem muito poder, as pessoas têm muita memória e ela não pode ficar presa, amarrada ao passado ou amarrada a um a uma narrativa só”, afirma LEOA.

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15/08/2025

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