O urban jazz de Jonathan Ferr é uma viagem de volta para casa; leia faixa a faixa de “Lar”

30/09/2025

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Por: Revista NOIZE

Fotos: Divulgação/Victória Borbolato

30/09/2025

A casa, para além de um espaço físico, também é carregada de símbolos. É o lugar de encontro e cuidado, com os entes queridos e consigo mesmo. Talvez seja por isso que, em inglês, “home” e “house” não têm o mesmo significado. É dessa reflexão que nasce Lar (2025), terceiro álbum de Jonathan Ferr.

O novo álbum chegou às plataformas em 17/9. Ele quer apresentar o “lar” como um ambiente que explora memória e pertencimento. “Esse disco é sobre voltar para casa. Mas não a casa de tijolos. É o corpo, a alma, o centro. Um lugar onde a gente pode sentir tudo sem medo e existir por inteiro”, explica o artista.

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Para ele, o lar não precisa ser uma casa, mas um quilombo, um navio interestelar e até uma comunidade virtual. Em um mundo desconectado, a revolução está em viver o presente e criar laços significativos, como refúgio seguro e uma utopia projetada. Em Lar (2025), a produção foi assinada por Julio Raposo e Douglas Moda.

Nas 11 faixas, as participações mais do que especiais se completam com Ana Karina Sebastião — baixista da Liniker e do Fresno Dino d’Santiago, Nova Orquestra, Duda Raupp, Jok3r e Marcos Valle, que virou seu amigo. Vale destaque para “Permanência do Som”, interlúdio com Pedro Bial, da chamada do próprio programa, quando Jonathan foi entrevistado pelo jornalista.

Na sonoridade, o jazz já característico do seu trabalho, mas que quer quebrar fronteiras, com elementos do MPB, R&B e hip-hop. A discografia de Jonathan — sempre poética — se completa com os álbuns Cura (2021) e Liberdade (2023).

A ideia do álbum nasceu em 2023, após Jonathan perder o pai. “Lar é um convite ao autoencontro. Um lugar simbólico onde finitude, amor, saudade e desejo se entrelaçam. Uma travessia que parte da dor e da ausência para alcançar a celebração da vida em sua inteireza”, finaliza ele.

Leia (e ouça) o faixa a faixa abaixo:

“Casa”: quando a gente pensa em “lar”, a primeira coisa que vem na nossa cabeça é “casa”. A construção e edificação da casa. Depois, eu desenvolvo ao longo do álbum que “lar” não é somente a casa, é sobre o nosso corpo também, sentimentos… mas eu queria trazer nessa primeira música a unidade que é comum a todos quando a gente pensa na ideia de lar.

Com ela, quis falar que a música instrumental continua sendo meu edifício, minha base. A partir desse ponto de referência, eu parto para ir a outros lugares. A participação dessa faixa é a Ana Sebastião, uma baixista maravilhosa, e como é uma música muito ‘groovada’ eu queria a participação de alguém, sobretudo uma mulher.

“Inteiro”: é a sequência de “Casa”, a instrumentação é praticamente a mesma e “Casa” é como se fosse um interlúdio de “Inteiro”. Todo o discurso que tem no álbum está presente nessa música. É algo que trabalhei muito em terapia, sobre estar inteiro para mim, ela é fruto de muitas reflexões, leituras e conversas. Escrevi logo depois que meu terapeuta faleceu, um cara que me acompanhou durante seis anos, e foi uma perda muito simbólica e significativa para mim.

Eu falo muito sobre perder o meu pai, mas, perder meu terapeuta foi quase a mesma sensação, pois ele era meu mentor. “Permanecer em si para continuar sendo inteiro”, ele falava muito isso, e trouxe isso como uma forma de homenagear ele, mas falando de mim.

“Tô Apaixonado”: é uma love song do disco, uma das primeiras músicas que compus nesse movimento do álbum, e essa faixa fala sobre a emoção mais nobre, o amor. Esse disco é muito narrativo, de um homem preto em autoencontro, em descoberta, abrindo espaço para esses sentimentos e emoções. Acho que é uma canção que me expõe, eu me desnudo, estou em um lugar de muita vulnerabilidade.

Quando eu falo “não queria pagar de emocionado” é porque existe um medo que conversa com outros homens pretos também. E eu falo sobre o homem preto porque existe muito esse lugar que, durante muito tempo, o homem preto não foi padrão de beleza — em alguns lugares, ainda não é — mas, de uns anos para cá, o ‘black beautiful’ ganhou força e, a partir disso, chegamos em um lugar de se entender e também conseguir se colocar vulnerável em uma relação, expressar o que sente, dizer o que sente.

“Infinito”: compus para o meu pai, é uma música que fala sobre quando alguém se vai, uma pessoa vai para longe – isso pode ser um término ou sobre alguém que se foi mesmo — mas esse amor infinito continua acontecendo porque essa infinitude é que faz a gente ter essa sensação de que essa moradia não se extinguiu. O Dino estava comigo quando fiquei sabendo da morte do meu pai, ele super me acolheu e quando fizemos a faixa. Ele deixou a música ainda mais linda do que já era. É a mais emocionante do álbum, para mim.

“Eixo Novo”: é uma das minhas preferidas do disco, pois ela tem uma verdade intrínseca, que sai de lá de dentro. Essa música surgiu de uma imagem de um cara no pico de uma montanha bem difícil de subir e, quando ele chega lá em cima, ele fala “e agora? O que faço aqui?” Nisso, a intuição diz para ele que, a partir desse momento ele só consegue voar.

Para ele voar, ele precisa se jogar da montanha e acreditar que ele vai voar. Tem esse lugar de autoconfiança e saber aquilo que você quer fazer e acredita que esse lugar que você quer chegar é possível. Isso veio de um estado de solidão, eu estava viajando para vários lugares, e comecei a escrever essa música após ver uma frase no Instagram que diz que “quanto maior o voo, mais solitário ele é”. Então essa música fala muito do tal “chegar lá”. Que “lá” é esse?

“Permanência do Som”: essa faixa traz um texto lindo que o Bial escreveu para me apresentar no programa dele e eu coloquei na introdução da música. Ao trazer esse discurso, eu o transformei em parte da minha própria obra.

“Saudade”: foi a primeira música desse álbum, na época eu nem sabia que se tornaria parte do álbum, pois ia ser lançada como single. Eu compus ela na semana que meu pai faleceu e isso a ressignificou completamente. É uma música muito forte, eu estava na Europa quando ele fez a passagem, foi muito difícil, eu estava em estúdio enquanto acontecia o velório dele.

Pedi para abrirem uma sala no Zoom para eu acompanhar o velório e aí eu toquei essa música pelo telefone como quase uma despedida minha para ele. Nesse momento eu pude expressar para ele o quanto eu o amava, o quanto ele é importante. “Saudade” é sobre o amor, né? A gente só sente saudade de quem a gente gosta, de pessoas que são importantes. “Saudade” é sobre memórias boas, sobre pessoas que fazem a diferença.

“Raro”: fala sobre ser raro, porque cada um é único. Cada um compõe a sua própria história e ninguém vai fazer o que o outro faz, porque só “essa pessoa” pode fazer. É uma música que nos leva para esse lugar.

“Tudo o que eu sou”: essa música é de 2013, nunca tínhamos lançado, e a usamos de guia para gravar de novo. Nós brincamos que a fizemos “quando tudo era mato”. Eu e Luccas Carlos novinhos, correndo atrás das nossas paradas e fazendo a maior correria para tudo acontecer… Essa faixa é uma celebração do nosso encontro.

“Visceral”: ela vai para o mesmo lugar de “Tô Apaixonado”, também é uma love song e fala sobre expressar abertamente o que sente, sobre ser intenso. É um convite para que a pessoa mergulhe no meu mundo, pois eu falo “eu sou mar, então vem mergulhar no meu mar”.

Foi muito gostoso trabalhar com o Jok3r, eu admiro muito o trabalho dele, e ele traz também um pouco do jazz, um R&B bem contemporâneo e lento. Quem tem essa coisa da visceralidade quando está amandom vai se identificar bastante.

“Almar”: conheci o Marcos Valle no ‘Conversa com Bial’, fomos no mesmo dia para gravar e depois disso trocamos telefone e nos reencontramos em um show dele. Aí, ele me chamou para ir na casa dele, tomamos vinho juntos e ficamos super amigos.

Aí, levei uma música que eu tinha feito e falei: “queria que você me ajudasse a escrever essa letra”. Foi daí que saiu a faixa, que é um neologismo, sobre “amar com a alma”, fechando o disco. Ela fala algo como “quando o sol não aparecer mais e eu não tiver mais nada, que eu ainda vou te encontrar porque é um amor que transpassa o tempo”.

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30/09/2025

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